Arquitetura e Design de Interiores |
Entrevista com Inês Scisci Maciel
Em setembro de 2024 a renomada arquiteta campineira Inês Scisci Maciel nos concedeu uma agradável entrevista, o que nos deixou bastante felizes por sua confiança em compartilhar conosco um pouco de suas opiniões, vida e experiências profissionais.
Inês nos recebeu numa manhã de sol intenso em seu escritório na Nova Campinas. Fizemos a entrevista numa ampla sala de reuniões, sentamo-nos em uma grande mesa e junto à parede havia vários troféus, prêmios que Inês recebera, ao longo dos anos, em sua carreira.
Perguntada sobre o início de tudo, Inês disse que uma pessoa já nasce arquiteta. Lembra que desde muito cedo recortava dos jornais anúncios de venda de apartamentos e brincava de copiar as plantas baixas em um caderno de folhas sem pauta. Quando chegou a hora de escolher qual vestibular faria, cogitou a possibilidade de prestar para medicina. Porém, um amigo muito sábio teve o cuidado de lhe mostrar com maior clareza o que realmente é ser médico. Inês desistiu imediatamente e fez arquitetura.
Formou-se na PUC/Campinas há vinte e cinco anos e, desde então, vem desenvolvendo uma carreira muito bem sucedida. Suas referências são o arquiteto Paulo Mendes da Rocha e Lina Bo Bardi, cuja obra mais conhecida é o MASP.
Em seu trabalho procura desenvolver uma linguagem contemporânea, porém sempre um pouco misturada com o clássico. Uma coisa de que não gosta na arquitetura de hoje é quando o projeto fica com a aparência de ambiente comercial. Mesmo quando o contemporâneo predomina é preciso que a casa tenha jeito de lar. Diz que fica impressionada quando visita alguns condomínios e vê que a cor escolhida para as fachadas das casas foi o cinza.
Em seus projetos, procura sempre reservar um espaço, bem dosado, para a cor, pois em sua opinião a cor traz aconchego. Os tons terrosos têm a propriedade de dar acolhimento.
Considera fundamental que o arquiteto tenha sensibilidade para perceber o cliente em suas preferências, necessidades e momento de vida, antes de conceber o projeto. O arquiteto tem que tomar cuidado porque quem vai morar na casa é o cliente, quem vai viver uma vida naquele ambiente é o cliente, então o arquiteto não pode tomar decisões sobre a vida de outra pessoa.
Para Inês, a fase preliminar requer muita conversa; é realmente preciso conhecer o gosto da pessoa. O objetivo a se alcançar é que a pessoa se sinta bem onde vai morar.
Inês considera que não é difícil perceber as pessoas. Mas é necessário dispender tempo em entrevistas, em ir à casa onde ela está morando, ficar atento à história de sua vida. Um de seus cuidados como profissional é aproveitar ao máximo aquilo que a pessoa já tem. É papel do arquiteto adequar as coisas, principalmente aquelas com valor afetivo, ao projeto da nova casa.
Na história da arquitetura, ela ensina que o momento atual permite tudo, não há mais correntes, estilos ou nada semelhante. Hoje você não precisa atender a uma determinada tendência e dizer a seu cliente que ele deve ter isso ou aquilo porque é o que está na moda. Hoje pode-se tudo. O importante é que o resultado seja harmonioso, você pode fazer praticamente qualquer mistura, desde que seja cuidadoso para atingir a harmonia, o agradável, com cuidado para não criar uma aberração. É possível misturar clean com clássico, com industrial, com brasileiro, com o estilo escandinavo, com o minimalismo. Há um leque muito grande de possibilidades. A harmonia tem que dar a tônica do projeto.
Quando perguntada sobre qual, dentre todos os seus trabalhos, é o preferido, ela respondeu que sempre gosta mais do último. Diz que o processo em si lhe agrada, quando é fácel trabalhar com determinado cliente, acaba gostando daquele trabalho. Uma coisa de que gosta muito é fazer as brinquedotecas das delegacias das mulheres. Esse é um trabalho que Inês faz como voluntária, ela chama de arquitetura social e considera como algo que realmente lhe traz grande realização.
Inês diz que nesse momento está vivendo um período em que sente grande prazer na arquitetura social, mas lembra que, desde o início, sempre fez isso, sempre atendeu pessoas muito simples e, no entanto, dedicou-se com carinho e especial atenção a cada projeto. Nunca se negou a fazer trabalho voluntário quando convidada.
Acredita que poder realizar esse tipo de trabalho faz parte do compromisso de ser arquiteta. Entende que a casa pode ser simples, porém deve ser correta ao ponto de proporcionar a seus moradores saúde física e emocional.
Inês defende a ideia de que deveria haver um órgão, seja ele uma fundação, instituto ou uma Organização da Sociedade Civil que, à semelhança dos serviços públicos de saúde, oferecessem às pessoas mais carentes uma assistência nos projetos, construção e manutenção de suas casas. Esse seria um serviço preventivo que evitaria muitas doenças, trazendo maior produtividade aos moradores e menos gastos públicos com saúde.
Inês vê as cidades com um olhar bastante crítico quanto à sua constituição, crescimento e reformas. Entende que a arquitetura tem muito a contribuir para melhorar o ambiente urbano. Salienta, por exemplo, a dificuldade em se andar pelas calçadas. É sabido que trinta por cento da população brasileira possui algum tipo de deficiência, além disso o percentual de idosos está aumentando. A arquitetura tem potencial para ser uma aliada do Poder Executivo.
Após quase uma hora de uma boa conversa, Inês nos pediu licença porque tinha outros compromissos marcados para o dia. Observamos que ela é uma pessoa muito ativa e ocupada. Ela nos disse que o segredo está na administração do tempo. As pessoas mais ocupadas são aquelas que sempre encontram tempo para assumir uma nova responsabilidade.